Wednesday, August 08, 2007

OS EDIFÍCIOS NOVOS E OS IMÓVEIS EM RUÍNAS ou OS CONDOMÍNIOS DE LUXO E AS HABITAÇÕES SOCIAIS

salvadorpereirasantos@hotmail.com

Face à crescente degradação do património edificado do Centro Histórico de Vila Nova de Gaia, a Câmara Municipal responde com um ritmo quase esquizofrénico de novas construções e retrai-se nos esforços conducentes a recuperação dos imóveis existentes, alguns com patologias quase irreversíveis e sem condições de habitabilidade. Por outro lado, o número de novas habitações destinadas a gente da classe média, ou média baixa, parece resumir-se a um empreendimento financiado a fundo perdido pelo Instituto Nacional de Habitação, enquanto os condomínios fechados e os complexos habitacionais de luxo, apenas ao alcance da classe média alta e superior, multiplicam-se pelo território ribeirinho vizinho do Cais.

Apenas a título de exemplo, recordo que a Câmara Municipal promete erguer até final do próximo ano, num terreno devoluto no gaveto da rua General Torres com a rua de Guedes de Amorim, uma Urbanização Social, denominada Miradouro e projectada pelo arquitecto Rui Loza, que terá entre 45 a 55 apartamentos e um pequeno mercado “popular” no rés-do-chão, destinada, segundo a edilidade de Gaia, a famílias carenciadas que vivem em edifícios degradados no Centro Histórico, enquanto junto ao Douro, no lado poente, nascem mais dois empreendimentos de luxo para gente de grandes posses económicas, a juntar a mais uns quantos que dia após dia vão sendo anunciados com pompa e circunstância por Luís Filipe Menezes e seus pares.

O velho edifício onde funcionou a Destilaria de Álcool vai dar lugar a um Complexo Habitacional com 48 fogos de tipologia variada, que serão comercializados a um preço estimado em 2.550 euros/m2, e no espaço onde funcionou até final do ano passado o Hard Club vai nascer o Rei Ramiro Terraces, um empreendimento residencial com 19 moradias servidas por uma piscina de condomínio na cobertura, cujo preço por m2 se estima em 3.000 euros. Em ambos os casos regista-se a assinatura do arquitecto Pedro Balonas, que, a convite da empresa britânica Squarestone Atlantic LLP, desenhou casas de sonho, para gente de grandes fortunas e de gosto fino, com… «amplas salas e quartos de dormir virados para o Douro».

Pese embora todas estas evidências, Luís Filipe Menezes sublinha, com o populismo e a demagogia que o caracterizam, que «a Urbanização Social Miradouro será para famílias da Zona Histórica a viver em más condições, evitando, assim, que partam para outras freguesias e deixem os locais de origem». Este facto é muito curioso e paradoxal se atendermos que um dos maiores males que a Câmara Municipal tem feito no Centro Histórico prende-se exactamente com o seu esvaziamento de habitantes, nomeadamente dos mais velhos, dos que lá nasceram ou viveram desde muito jovens, que foram deslocados “à força” para outros lugares com a promessa de que voltariam, e que por lá continuam, desenraízados, desiludidos e amargurados.

Se a Câmara Municipal de Gaia quisesse de facto manter na beira-rio os homens e mulheres que lá vivem, invistiria prioritariamente na reabilitação urbana, num desenvolvimento completo e integrado do Centro Histórico, envolvendo o património físico, as pessoas e o seu meio ambiente, de forma a preservar a memória do seu passado e a assegurar o seu futuro como espaço agregador, multigeracional e interclassista. Mas é óbvio que o objectivo é outro. Menezes está sobretudo interessado em atrair para o local os mais poderosos, os ricaços, os homens do golfe e do ténis... a nata do jet set nacional! O senhor presidente não quer um Centro Histórico para todos, mas apenas para alguns, transformando-o numa espécie de “passerelle” do luxo!...

É preciso impedir que se consuma a “construção” de um Centro Histórico a preto e branco!... Para que esta situação não se torne irreversível é urgente intervir, dizer basta! Na realidade, o que está em causa é a preservação de um vasto acervo fundador da nossa identidade e da nossa memória colectiva, materializado na diversificação de uma “paisagem” que constitui o espaço de afirmação da história Vila Nova de Gaia, que é da responsabilidade de todos. A massa critica do concelho parece anestesiada pelo marketing municipal. «Gaia é Obra» e «Gaia está na Moda» são apenas frases de publicidade enganosa, que escondem uma realidade preocupante: o futuro de boa parte do nosso passado está comprometido... mas não ainda irremediavelmente!

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