Saturday, January 05, 2008

UM PROJECTO VELHO PARA O ANO NOVO – A PROPAGANDA CONTINUA!!!

salvadorpereirasantos@hotmail.com

Nos últimos dias do ano findo, a Câmara Municipal de Gaia recuperou do velho baú de relíquias um dos seus mais antigos projectos e anunciou-o como “coisa nova”. Por distracção (não, não pode ter sido por submissão às grandes agências de comunicação…), alguns jornais caíram no logro e fizeram eco de uma notícia que já tem “barbas”: a requalificação da margem esquerda do Douro, a montante da Ponte D. Luís. Há mais de um ano e meio que este projecto foi apresentado em reunião de Câmara, noticiado com honras de primeira página no Jornal de Gaia (!) e discutido depois em Assembleia Municipal. Até eu já tive oportunidade de me referir a este projecto e aos perigos de natureza social que ele encerra, designadamente quanto às repercussões negativas que pode ter na vida dos cidadãos moradores na Serra do Pilar.

Se ainda subsistissem dúvidas quanto às consequências sociais que podem resultar do projecto, o vice-presidente da Câmara Municipal de Gaia dissipou-as por completo ao afirmar que «a autarquia pretende demolir todas as construções clandestinas que se encontram nas encostas junto ao rio». Marco António Costa esquece-se, porém, que a esmagadora maioria das casas a que chama clandestinas ainda não foram reabilitadas e regularizadas por exclusiva responsabilidade da Câmara e que esta continua a cobrar aos seus proprietários (leia-se também moradores), através das empresas municipais, todos os serviços que lhes presta… e também alguns dos que não lhes presta! A taxa de saneamento, por exemplo, consta da factura da Águas de Gaia, mas saneamento é coisa que por ali não existe… como muito bem se pode “cheirar”!

O edil diz ainda que «o projecto pretende criar melhores condições de recepção para os turistas», o que é sintomático. Ele parece ignorar que o aumento e a qualificação da oferta turística não pode passar apenas pelo aproveitamento turístico das margens do Douro, sendo absolutamente necessário promover uma maior ligação entre a cidade e o rio, através da reabilitação urbana, da valorização ambiental, da criação de novas dinâmicas culturais e da preservação do património… sem destruir a alma dos lugares: as pessoas! E como acontece em quase todas as políticas que o autarca tem subscrito para a zona histórica, o projecto que ele agora recuperou com o objectivo único de ganhar mais algum espaço de “publicidade não paga” nos órgãos de comunicação social, as pessoas (de Gaia) quase não contam.

Já nada me surpreende vindo de quem vem. Há muito que as pessoas deixaram de contar para as “contas” de Marco António Costa. E isso é notório no projecto por ele agora ressuscitado, ao omitir algumas valências que constam da sua versão original (como os espaços para a prática de desportos informais ou as hortas sociais para moradores), em contraponto com a surpreendente novidade do «aproveitamento urbanístico de algumas das casas senhoriais que existem nas encostas». Note-se que estas casas, há muito votadas ao abandono e em elevado estado de degradação, serão – de acordo com o edil – destinadas a “segundas habitações” (para gente de fora, como é óbvio). A concluir este bonito ramalhete, não podiam faltar as áreas vocacionadas para desportos náuticos e (claro…) os campos de golfe!

Como se pode facilmente perceber, o velho projecto que a Câmara de Gaia “ameaça” apresentar publicamente no primeiro semestre de 2008, entretanto retocado no segredo dos gabinetes, não tem minimamente em linha de conta os interesses dos gaienses que residem na zona a reabilitar. E alguns deles sobrevivem na Serra do Pilar há perto de 35 anos sob a ameaça constante de enxurradas ou deslizamentos de terras que os arrastem para as águas do rio juntamente com as suas humildes casas, consideradas clandestinas mas sobre as quais pagam Imposto Municipal (!), sem que a autarquia tenha feito até hoje o mínimo que lhe é exigido no quadro das suas competências: cuidar da regular limpeza da encosta e da consolidação dos elementos naturais, de forma a evitar réplicas das tragédias que por lá ocorreram num passado não muito distante.

Termino sublinhando a necessidade de uma maior ligação da cidade ao Douro, através de um política conjugada entre o turismo, o social e a cultura. A reabilitação da margem do rio pode representar uma parte importante do sucesso de uma estratégia de desenvolvimento e exploração do enorme potencial turístico do Douro, desde que a cidade não fique à margem! De que nos serve ter uma marginal “alindada” com um Cais aprazível e as encostas junto ao rio verdejantes e belas, se o interior da cidade continuar triste, degradado, sem brilho nem chama?! De que nos serve ter um Douro cheio de turistas navegando rio acima, rio abaixo, se as nossas gentes continuarem naufragadas em guetos sociais “terceiro-mundistas”, asfixiadas em pesadelos de eventuais derrocadas das casas em que vivem ou sufocadas em espaços urbanos com uma oferta cultural quase confrangedora?!...

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